quinta-feira, 6 de novembro de 2008

EDUCAÇÃO

Didática do professor ocupa só 10% do currículo das licenciaturas
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Pesquisa feita nas áreas de Letras, Matemática e Biologia mostra também que não há regras claras para estágios

Os cursos de licenciatura em Letras e Ciências Biológicas das faculdades e universidades brasileiras dedicam apenas 10% da grade curricular para conhecimentos sobre didática. No caso da Matemática, a proporção sobe para cerca de 30%. Além disso, 95% deles não têm especificações para seus programas de estágio. Para completar, a maior parte dos concursos realizados por prefeituras e Estados para contratar profissionais concentra suas perguntas em aspectos da legislação, sem apresentar bibliografia nem questionamentos sobre práticas de ensino.

Em resumo, as instituições de ensino superior estão formando mal o futuro professor, os estágios dentro das salas de aula são mal formulados e pouco aproveitados e, na hora de contratar, as redes de ensino não sabem selecionar os mais preparados.

O cenário, que ajuda a identificar as falhas na formação profissional dos docentes, e na sua posterior contratação, foi traçado por um estudo feito pela Fundação Carlos Chagas a pedido da Fundação Victor Civita. Uma primeira etapa da pesquisa, que analisou os cursos de Pedagogia, foi divulgada no mês passado. A pesquisa levou em conta as grades e emendas curriculares de cursos oferecidos por instituições públicas (estaduais e federais) e particulares.

"Oferecer apenas 10% da grade para conhecimentos para docência é muito, muito pouco, porque se trata de licenciatura, não de bacharelado. Estamos falando do curso dedicado a formação de professores", afirma a consultora pedagógica da Fundação Victor Civita, Regina Scarpa. "Não há preocupação com ensino e aprendizagem por parte dessas faculdades, apenas com conteúdos específicos de cada área e, quando chega a hora de as secretarias selecionarem os mais bem preparados, elas também falham e só completam esse ciclo de problemas", diz.

Ela conta que a idéia de traçar um raio X dos cursos de licenciatura do País surgiu no ano passado, quando uma pesquisa feita pelo Ibope mostrou que 64% dos educadores avaliavam o curso em que se graduaram como excelente ou muito bom, mas 49% diziam que esse mesmo curso não os preparou para a realidade da sala de aula. "Então eles estavam dizendo que o propósito do curso em que se graduaram, que era justamente prepará-los para a sala de aula, não foi cumprido", explica Regina.

Os questionamentos em torno do currículo dos cursos de Pedagogia e outras licenciaturas têm

despertado polêmica no meio educacional. No início do ano, a secretaria de Educação do Estado de São Paulo, Maria Helena Guimarães, acirrou o debate quando fez duras críticas às universidades, afirmando que não conseguiram preparar o profissional para a sala de aula. Na outra ponta, coordenadores de curso defenderam as grades curriculares afirmando que os gestores estavam tentando atribuir a responsabilidade pelos problemas da educação à universidade.


USO DO TEMPO

"Há muito tempo estamos dizendo que uma das questões fundamentais para valorizar a

categoria e chegar na qualidade de ensino que queremos começa numa formação inicial consistente, o que ainda não temos", defende Roberto Franklin Leão, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Para ele, é necessária uma discussão sobre a grade curricular dos cursos, que devem preparar o aluno para ser capaz de transmitir da melhor maneira os conhecimentos que está estudando em sua área de licenciatura.

Coordenador do curso de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de São

Paulo (Unesp), do câmpus de Assis, Carlos Alberts acredita que 10% é um porcentual muito baixo, mas afirma que não será apenas aumentando o número de horas de aulas de práticas pedagógicas que a qualidade do professor que está chegando às salas de aula vai ser melhor.

"Esse valor, de 10%, é realmente baixo para um curso de licenciatura. Mas acredito que a qualidade não vem do aumento de aulas, mas do melhor aproveitamento das que existem", conta ele, que explica que na Unesp de Assis a proporção é diferente, de quase um terço para esses conteúdos. Lá, o curso foi reformulado há pouco tempo justamente para reagrupar disciplinas voltadas para a didática do professor.

O coordenador faz ainda uma crítica à academia e aos estágios atuais: "As aulas precisam ser usadas de maneira mais racional. Os estágios no qual os alunos apenas observam professores da rede e fazem um relatório do que viram trazem poucos retornos e são muito comuns. É preciso mudar isso."


Fonte: O Estado de São Paulo

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